Fim de ano é época de correria, né? Parece que tudo o que não fizemos durante o ano tem que ser concluído até a véspera do Natal. Temos que comprar presentes, arrumar a casa, nos preparar para as festas, participar das milhares de confraternizações que parece que são obrigatórias nessa época do ano. Ufa!
Nessa turbulência, muitas vezes esquecemos do verdadeiro sentido desse período, que, para o cristão, é se preparar para a chegada de Cristo. Preparar o coração. Esse período é chamado de Advento – e começa no quarto domingo antes do Natal.
Pensando nisso, busquei para vocês uma reportagem sobre o assunto que fiz há alguns anos para o jornal Notícias do Dia. Ela é grande, eu sei, mas vale a pena dar uma conferida.
E na semana que vem, me aguardem. Vou postar aqui uma receita bem tradicional de bolachas de Natal, aquelas da vovó.
Vejam a reportagem que produzi em 2019.
Advento – Tempo de se preparar para o Natal
Neste domingo, quando o designer têxtil Sidney Schroeder, reunir a família em torno da mesa, ler a Bíblia e acender a primeira vela da coroa do advento, estará fazendo mais do uma simples oração. Estará começando uma caminhada em direção ao Natal e mantendo viva uma tradição que trouxe dos pais, avós e bisavós e cultiva a cada ano em sua casa: a celebração do advento, um ritual de preparação espiritual para a chegada de Jesus Cristo, em 25 de dezembro. “Ele nos prepara para a Noite Santa”, constata.
Sidney explica que na noite de cada um dos quatro domingos que antecedem o Natal, ele, a esposa, os três filhos e respectivos cônjuges, e netos sentam ao redor da mesa, em um momento de confraternização e união. Abrem o evangelho, escolhem uma passagem e leem em voz alta, refletindo e explicando a mensagem para o entendimento de todos e, principalmente, da criançada. Depois dão as mãos em uma oração e, por fim, acendem a vela.
A cada semana, uma vela a mais é acesa, até que na última semana, a que antecede o 25 de dezembro, as quatro velas do advento iluminam a casa, simbolizando que está tudo pronto para a chegada do Natal. “Formamos uma corrente de amor, respeito e oração, agradecendo pelo ano que está findando e pedindo a Deus a graça de nos preparar espiritualmente para o recebimento das bênçãos da Noite Santa”, detalha ele, explicando que músicas natalinas instrumentais podem ser colocadas ao fundo, mas não se sobrepõem à confraternização. Da mesma forma, o lanche é servido em outro momento e está longe de ser o centro das atenções – na hora do Advento, a preparação espiritual é o foco das atividades.
A preparação contém outros elementos. Nesta época, a casa recebe os primeiros enfeites e o aroma das bolachas de melado já são sentidos no ambiente, o que já vai fazendo com que a família entre no clima. Cada peça tem um significado e ele é destacado, explica Sidney. Assim, o verde da coroa do advento lembra o pinheiro, que resiste às intempéries e mantém a cor durante todo o ano. “Significa a tenacidade, o poder de Deus… mesmo que haja intempéries em nossa vida, a gente tem que resistir”. Já as velas e os laços são vermelhos, para lembrar o amor e a doação de Jesus. “Vermelho é a cor do amor. Lembra Jesus, que nos amou e derramou o vermelho de seu sangue para nossa redenção”, ensina Sidney.
Formamos uma corrente de amor, respeito e oração, agradecendo pelo ano que está findando e pedindo a Deus a graça de nos preparar espiritualmente para o recebimento das bênçãos da Noite Santa.
Com essas reflexões, semana após semana, mesmo durante a agitação comum nessa época do ano, é criado um ambiente de paz dentro de casa. E a intenção é que esse clima se reflita fora de casa, no trabalho e nas demais relações. “A gente luta tanto… O mundo tem tantos conflitos, em todos os seus quadrantes… Isso também nos atinge”, afirma o designer, destacando que a intenção é que este clima de paz e respeito exercitado no advento seja levado para a vida.
“E isso você leva para o trabalho, para o dia a dia… quando você tem o coração puro, as pessoas que te cercam sentem isso, sentem algo diferente, percebem que você é uma pessoa agradável”, destaca Sidney, que quer deixar esta herança de gerações para seus descendentes. “Ainda está de pé e estou tentando passar isso para os meus filhos, porque faz muito bem. Essa é a herança que posso dar para deixá-los fortalecidos”, afirma.
A luz que humaniza
Este tempo de reflexão e preparo espiritual não é só celebrado dentro de casa, em família. Ele também é um momento de encontro das comunidades cristãs. A pastora Eli Deifeld, da Igreja da Paz, revela que, mesmo entre os luteranos, já não é tão comum se celebrar o Advento em casa e muitas famílias já optam por celebrar na igreja. Por isso, a cada ano a Igreja da Paz celebra seu tradicional Culto à Velas, uma celebração festiva que marca o começo do Advento para o luterano.
A pastora explica que o calendário litúrgico é dividido em três blocos: o Advento, que é o tempo de preparação para o Natal, o nascimento de Jesus; a Páscoa, que inclui toda a Quaresma; e o tempo comum, que vai da Páscoa ao Natal. A cor usada na liturgia é a mesma da Páscoa, o lilás, ou roxo, que representa a espera. “Dentro da igreja é um tempo de espera, de preparo. O Advento é a preparação para o Natal”, ensina, explicando que ele termina no último domingo antes do Natal, conhecido como Cristo Rei.
“Um momento para se voltar para a espiritualidade e se perguntar para onde a gente está indo”.
Na Igreja da Paz, o culto às velas marca tradicionalmente o início do período. A celebração é composta por uma cantata preparada pelo Coral da Paz. A ornamentação da igreja conta com três grandes pinheiros, simbolizando o verde, que nunca morre, e o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Para completar, a coroa do Advento, que tem sua primeira vela acesa. “Ela representa a chegada da luz de Deus no mundo”, destaca, explicando que é uma noite de introspecção. “Um momento para se voltar para a espiritualidade e se perguntar para onde a gente está indo”. A decoração inclui ainda elementos como sinos e anjos, cada um com sua simbologia própria.
O mais importante do período, porém, destaca a pastora, é cultivar o momento de reflexão que às vezes fica esquecido diante do consumismo frequente nesse período. Nada contra comprar presentes, agradar a quem se quer bem, mas o mais importante é não se perder no ato das compras e deixar de lado o verdadeiro sentido dessa época do ano. “Queremos incentivar que o advento seja não só um tempo de comprar presentes, mas principalmente de se preparar com Deus e a humanidade. Este é o momento de reflexão”
E por que as luzes? “Acima de tudo é para lembrar que a luz de Cristo brilha. Que a luz de Deus se fez ser humano, em Cristo, para justamente nos humanizar”, ressalta.
Tempo de solidariedade e esperança
Para os católicos, o advento também é um tempo de espera e preparação para o que há de vir, ou seja, para a chegada de Jesus Cristo. O padre Ivanor Macieski, assessor Diocesano de Comunicação, porém, explica que esse evento é visto e vivido pela Igreja Católica de duas formas: a primeira como a espera pelo Deus que vem ao encontro de cada um todos os dias, seja na figura de uma outra pessoa, um irmão, ou nos acontecimentos da vida. “Todo dia pode – e deve – ser Natal porque Deus vem ao nosso encontro na forma de uma pessoa”. Isso ajuda a entender porque especialmente nessa época do ano a solidariedade é exercitada de forma mais acentuada. “A melhor forma de encontrar Deus é ajudar o irmão. Por isso é um tempo de solidariedade”, afirma, destacando que as atitudes concretas traduzem os gestos de amor.
“Todo dia pode – e deve – ser Natal porque Deus vem ao nosso encontro na forma de uma pessoa”.
A segunda forma como o evento é vivido pela Igreja é como a espera, a lembrança e os preparativos para a vinda de Jesus no final dos tempos. “Seria o nosso encontro final com o Senhor. A gente tem que estar preparado para esse momento”, destaca. Na prática, essa preparação ocorre nas quatro semanas que antecedem o dia 25 de dezembro, com a intensificação das missas e das novenas nas casas dos fiéis – e também da prática da confissão, que traz em si a lembrança de que é preciso preparar o coração para este momento de encontro, pedindo perdão.
A cor da liturgia é o roxo, o mesmo usado na Quaresma. O tempo do Advento, porém, tem na esperança sua principal mensagem. A coroa do Advento, com suas quatro velas, também é usada no ritual católico, a cada domingo. Ela é utilizada nas missas e nos grupos de família realizados nas comunidades. “Simboliza que a luz está próxima. É a espera do Senhor, que é a luz”, reforça o padre.
Para Ivanor Macieski, o grande cuidado nessa época é não deixar que o consumismo que toma conta das ruas e do comércio ofusque o significado espiritual do Natal. Ele lembra que o hábito de trocar presentes vem da ideia de que Deus deu à humanidade o que ele tinha de mais valioso, o próprio filho. Para o sacerdote, porém, o maior presente que pode ser dado nessa época não é o material, mas o sentimento que ele traz em si.
Uma prática incentivada pela Igreja Católica é a montagem de presépios, que lembra a cena do nascimento de Jesus. O padre lembra que o primeiro presépio foi montado por São Francisco de Assis, o que explica a simplicidade da cena e a presença dos animais. Ao lembrar o nascimento de Jesus, o presépio acaba sendo uma forma de catequização. A única observação é que, embora a montagem possa ser feita com antecedência, a imagem do menino Jesus só deve ser colocada no presépio no dia 25 de dezembro, quando é simbolizado o seu nascimento. Até lá, neste período de advento, a manjedoura permanece vazia, à espera do menino que veio trazer a luz.
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