Há algumas semanas circulam fotos da Metalúrgica Bennack nas páginas e grupos de Memória do Facebook. São fotos feitas pelo fotógrafo Fritz Hofmann, que ao longo da primeira metade do século 20 registrou o desenvolvimento de Joinville.
Isso despertou muitas perguntas sobre a história dessa empresa, que fez parte da vida de milhares de famílias de Joinville e foi uma verdadeira formadora de mão de obra qualificada para muitas indústrias da região. Então, segue um pouco dessa história, um verdadeiro quebra-cabeças que levei tempos para montar e onde ainda faltam algumas peças.
A origem da Metalúrgica Bennack
No final do século 19 e primeiras décadas do século 20, Joinville crescia rapidamente, demandando novos serviços e produtos. Pequenas oficinas, a maioria quase artesanais, começaram a se disseminar, gerando empregos e contribuindo para o desenvolvimento da cidade, que ainda vivia sob os efeitos do ciclo da erva-mate. Em 1893, Otto Bennack instalou sua ferraria na rua 7 de Setembro, na esquina da rua Itajaí, junto a sua casa. A pequena oficina se desenvolveu ao longo das décadas seguintes e se transformou em uma empresa estratégica não só para as demais indústrias da região, mas também para o governo brasileiro. Era a Metalúrgica Bennack, que produzia equipamentos para uso industrial e, nos anos 40, vagões e trilhos para as ferrovias. Além disso, na prática, funcionava como um centro de mão-de-obra qualificada, formando profissionais que depois iriam fundar novos empreendimentos ou atuar nas mais diversas empresas da cidade.
Como tantos outros empreendimentos de Joinville, o início da Metalúrgica Bennack foi modesto. Otto Bennack abriu as portas de sua oficina em 1893, consertando equipamentos e produzindo tornos.
Naquele período, a erva-mate e a indústria madeireira movimentavam a economia da cidade. Além do negócio em si, com a instalação de empresas de beneficiamento e comércio do mate ou o transporte de madeira, estas atividades incentivavam a instalação de outros empreendimentos prestadores de serviços ou fabricantes de peças e equipamentos. “A forte demanda das economias do mate e madeira influiu na posterior tradição metal-mecânica de Joinville”, analisou Isa de Oliveira Rocha, em seu livro “Industrialização de Joinville - da Gênese às Exportações”. Essa demanda estava por toda parte. Um exemplo são os carroções de São Bento, puxados por até seis cavalos e que transportavam toneladas de mate. “No auge do comércio do mate, chegavam a transitar na estrada Dona Francisca até 800 carroções (…) Ora, os carroções e as barricas, as ferraduras dos cavalos e outros objetos eram, em grande parte, produzidos nas oficinas de Joinville”, explica. Também havia a necessidade de peças, e reparos que eram feitos por ferreiros e mecânicos, em seus pequenos estabelecimentos, por exemplo.
O caminho até se tornar uma grande metalúrgica foi longo, mas nos anos 20, ela já era considerada a principal fundição de Joinville. No “Almanak de Joinville”, de 1928, a empresa era apresentada em dois grandes anúncios como “Otto Bennack - Officina Mechanica e Fundição de Ferro e Metal”. A lista de produtos era grande e incluía “machinas e installações completas em geral” de tornos, teares e espuladeiras, engenhos de serra, moendas para cana, bombas de todas as qualidades (movidas a motor e a mão), guinchos, ventiladores, moinhos, prensas e até ferros de engomar, eixos de transmissão e chapas para fogões.
O crescimento acelerou nos anos 30, quando as empresas do setor metalmecânico tiveram grande desenvolvimento em todo o país, abastecendo o mercado nacional. Otto Bennack cresceu junto, com a produção de tornos mecânicos. No “Blumenauer Volkskalender”, de 1933, um almanaque de Blumenau, redigido em alemão, já aparece a foto da empresa ocupando um prédio grande, de dois pavimentos, na frente das edificações mais antigas, em um extenso terreno na rua 7 de Setembro.
A Empresa Metalúrgica Nacional
Otto Bennack teve um filha, Erna Bennack, que casou com o blumenauense Carlos Jansen. Nos anos 40 era Jansen quem administrava o empreendimento. Nesse período, a metalúrgica fabricava vagões, trilhos e equipamentos ferroviários, um produto estratégico para o País. Bisneto de Otto Bennack, Carlos Jansen tem o mesmo nome do avô e lembra que a casa dele, na rua Aubé, em um morro bem em frente à Ciser, tinha toda a estrutura armada com trilhos de trem, fabricados na metalúrgica.
Considerada uma empresa estratégica, durante a 2ª Guerra Mundial ela foi encampada em julho de 1942 pelo governo federal, ficando sob comando de um interventor. “Na época da guerra o governo encampou para fazer material bélico”, explica Carlos Jansen, o neto. A informação é complementada no livro de Isa Rocha: “Durante a 2ª Guerra Mundial, o governo federal encampou-a, denominando-a Empresa Metalúrgica Nacional, para a construção e manutenção de vagões e equipamentos ferroviários, substituindo as importações”, escreveu.
Uma segunda versão, publicada na Revista do Sul, de 1961, afirma que a empresa foi comprada pelo governo federal em 1945 – ambas as versões, porém, concordam que o objetivo da medida era a fabricação e reconstrução de material ferroviário devido à dificuldade de efetuar importações na época.
O que aconteceu após a guerra, não é bem claro. Segundo Carlos Jansen, o neto, a empresa foi devolvida ao avô, que a vendeu. Pretendia se mudar para Ubatuba, em São Francisco do Sul, onde tinha uma área. “Se desfez da metalúrgica e tinha paixão por Ubatuba. Estava se mudando para lá, mas, em uma dessas viagens, infartou e faleceu”, conta, referindo-se ao início dos anos 50.
Já na Revista do Sul consta que a empresa foi colocada à venda pelo governo federal em 1950. Ela não diz exatamente quem a adquiriu, mas informa que a partir daí a empresa passou a ser chamada de Usina Metalúrgica de Joinville, sob a presidência do engenheiro Mário Catta Preta. Ela foi reestruturada e passou a fabricar máquinas variadas para a indústria brasileira. A produção de equipamentos para a indústria ferroviária permaneceu por algum tempo, mas a partir da década de 1960 deixou de ser feita por razões de mercado. A Usina Metalúrgica de Joinville ainda chegou a funcionar na rua 7 de Setembro. Só anos depois mudou-se para uma lateral da rua Santa Catarina.
Formadora de mão de obra especializada - Acompanhe a segunda parte dessa matéria e saiba mais sobre como era formada a mão de obra para as empresas da região ao longo do século 20.
Parte dessa matéria foi publicada originalmente no jornal Notícias do Dia/Joinville em dezembro de 2013 pela jornalista Maria Cristina Dias. O texto original foi complementado com informações obtidas posteriormente.
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Viajei no seu texto. Descia Serra Dona Francisca e fiquei imaginando aquele monte de carroções transitando por ali. Também conheci as fábricas e sentir o cheiro da graxa e o barulho das máquinas.
Excelente texto! Muito bem escrito e com uma história envolvente. Muito bom poder conhecer um pouco mais da história da nossa Joinville.
Aguardo com curiosidade o texto sobre o papel da Metalúrgica Bennack na formação de mão de obra. Meu pai, Otto Kiehn, sempre contava o quanto foi importante para sua formação ter sido aprendiz de um torneiro alemão nessa Metalúrgica. Suponho que tenha sido entre a segunda metade dos anos 20 e início dos 30.
Excelente resgate da história do parque industrial de Joinville.
Muito obrigada! Convido o senhor a se cadastrar no site para receber as novas postagens.
Texto bastante interessante, que através da pesquisa, relembra o surgimento das empresas metais-mecânicas em Joinville, quanto ao patrimônio industrial.
Presenciei a Metalúrgica Joinville no final de sua existência. A localização era em galpões onde hoje está instalado o Big Sul, que na época fabricava tornos para a indústria. Pena que devido às dificuldades na economia nacional e percalços administrativos, a empresa não teve continuidade. Parabéns Maria Cristina pela pesquisa e esclarecimentos quanto ao desenvolvimento industrial nesta cidade.
Sr Adhemar, muito obrigada pelo comentário. Convido o senhor a se cadastrar no site para receber os posts direto no seu e-mail e continuar a acompanhá-los.
Maria Cristina Dias,!
você que de tão longe veio, veio para resgatar nossa história.
Minha gratidão!
Marianne, minha querida, muito obrigada pelo carinho de sempre e por acompanhar meu trabalho há tantos anos. Estou postando a continuação dessa história e daqui a pouco, no início da tarde, ela estará na sua caixa de e-mail – e na de quem se cadastrou. Grande abraço